segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

lat. Speciális

Por Renato Bock

Cá venho para manifestar minha insatisfação com a qualidade Especial. Segundo o Huaiss, a especialidade se dá quando estamos fora do comum. Ora, aos meus olhos comuns, essa tal qualidade me dá gosto de quero mais. Não por sua versão positiva e culinária. “Ah, esse quitute está especial! Quero mais!”. Mas sim pela falta de qualidade científica e pouco qualificante de um adjetivo. Nem ao menos gênero ele assume!


O especial me diz muito pouco e por isso me incomoda. Ele está tão próximo do dizer nada que interrompe e encerra discussões que teriam potencial de ir muito mais longe. A situação econômica global é crítica e problemática, para uns. Para outros, a situação econômica global é a oportunidade de nova configuração do sistema estabelecido. Para o grupo dos encerradores, a situação econômica global é especial, e ponto! Encerra-se tão grávida discussão.


Ser especial não é bom, não é ruim, não respeita credo e nem tem posição política. Especial não escolhe time de futebol, apesar de cada time ser especial para seus torcedores. 


Ser especial para alguém é ser uma reunião de qualidades que não se sabe bem quais são. Ser bonito, gostoso, inteligente, carinhoso, abastado, podem estar impregnados no seu especial. No entanto, o tal especial, por preguiça de raciocinar, por pouca vontade de tecer e formular, encerra tudo em uma palavrinha joker. 


Alguns momentos carregam a tarja de especial. Ontem foi especial. Esse ano então, vai ser especial. A festa é especial. Outra vez vem a vontade de manjar mais qualificações. Especial por quê? Especial de que? Em que sentido acha-se fora do comum? Do padrão? Pra que? Por quê? 


656 milhões de coisas são especiais no Google. Será que são mesmo tão especiais, ainda que se considere economicamente a raridade de um bem a fonte de sua especialidade? Estar especial no mundo do mérito é se afastar da multidão calada, é sonho para sucesso, é sucesso para sonho, é plano de carreira. 


No mundo do occupy everything grita-se contra o especial. Valoriza-se o comum, o de todo mundo, o para todo mundo, o foco na maioria e não na exceção da regra.


Na cidade da gente diferenciada, o especial se faz paradigma. O espAcial é do privado, do mérito, da exploração, do especial. A diferença está na gente, no nosso ser. Ser especial em algo, para alguém, de alguém ou em qualquer coisa é o que te faz diferente da massa e o que te faz não se deprimir. Quem não se sente nada especial encontra-se socialmente deprimido. É preciso sair-se em algo!


Por isso tudo e desde já, lanço-me em campanha: Troque seu Especial por um adjetivo órfão!


Assim encerro este texto, para mim, tão especial... Quer dizer: Importante!





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Um comentário:

  1. Muito bom o texto...especial!!!!
    O mesmo acontece com o termo inclusão, por exemplo. Fala-se em inclusão e não se diz incluir onde, excluido de onde, por que excluído...enfim não se desenvolve o pensamento e a palavra inclusão fica mágica. Estes termos são ideológicos, na medida em que servem para ocultar, camuflar o que realmente se precisa conhecer. Valeu, Renato!!!!
    ana bock

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