Algumas questões filosófico-psicológicas, são discutidas por leigos com maestria. Então, cogitabundo que o Rê está, ele posta a seguinte reflexão.
“(...) A diferença entre um doido e um biruta é que o doido tem a tendência de se achar cordato enquanto que o biruta, sem refletir sistematicamente sobre a coisa, sente que os cordatos são muito sementeira simétrica, relógio suíço, o dois depois do um e antes do três, de maneira que sem emitir juízo, por que um biruta nunca é um bem-pensante ou uma boa consciência ou um juiz de plantão, esse camarada continua seu caminho por baixo da calçada e meio a contrapelo, e vai daí enquanto todo mundo freia o carro quando vê o sinal vermelho, ele pisa no acelerador e Deus te livre.
Para entender um doido convém ser um psiquiatra, mas nunca é o suficiente; para entender um biruta basta o senso de humor. Todo biruta é cronópio, ou seja, o humor substitui grande parte das faculdades mentais que constituem o orgulho de um prof. Ou de um Dr., cuja única saída em caso de falha é a loucura, ao passo que ser biruta não é nenhuma saída, mas uma chegada. Sempre levei muito a sério os birutas porque são o heteróclito nas pautas habituais, a terra do sal, húmus de futuro que se incorpora misteriosamente à substância cristalina constituída pelo cloreto de sódio, de cor normalmente branca e sabor acre característico, que é muito útil para sopa e guisados mas que tem algo de estéril, de entediante, de vale da morte.”
Trecho de “A volta ao dia em 80 mundos” , tomo II, de Julio Cortázar
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